“Estou sem estômago há dois anos e não sinto falta nenhuma!”

Eu tinha uma alimentação regrada e levava uma vida saudável, mas tive de...

Eu tinha uma alimentação regrada e levava uma vida saudável, mas tive de retirar o órgão inteiro por causa de um câncer. Hoje consigo viver normalmente sem ele.

     No dia em que completei exatos 20 anos no meu emprego de gerente de banco, recebi a notícia que mudaria minha vida de vez: as dores de estômago que eu sentia havia três meses eram resultado de um câncer. Como não havia histórico da doença na família, eu seguia uma alimentação regrada e mantinha um ritmo de vida saudável, fiquei surpreso. Eu, minha esposa e meus filhos nos abraçamos na sala de casa, todos chorando, e senti uma profunda gratidão. “Que bom, Senhor, que aconteceu comigo e não com eles”, agradeci. Mas, para vencer essa doença silenciosa, eu teria que tirar meu estômago por inteiro e aprender a viver sem ele.

Passei dos 80 kg para os 58 kg em 7 meses

     O câncer estava no estágio inicial, mas, mesmo assim, comecei a quimioterapia na semana seguinte ao diagnóstico, em maio de 2013. Cada sessão durava 46 horas. Eu ficava praticamente dois dias inteiros recebendo medicação na veia. Como já sabia que teria que remover o estômago, fiz as perguntas que você também deve estar se fazendo. Os médicos disseram que meu esôfago seria conectado diretamente ao intestino e ele faria parte da função do estômago (veja quadro na próxima página). Por isso, perderia grande parte do processo digestivo. Eu tinha consciência de que enfrentaria uma vida de limitações alimentares se quisesse eliminar esse mal do meu sistema de vez. Os doutores me informaram que as chances de cura eram maiores se eu tirasse tudo. Então, não hesitei. Depois de muita conversa e algumas leituras, entendi que meu corpo se ajustaria ao novo formato, permitindo que minha alimentação voltasse ao normal com o passar dos anos. Eu sabia que perderia muito peso no processo, como acontece com as pessoas que optam pela redução de estômago para combater a obesidade. No final da primeira quimioterapia, eu estava completamente sem forças. Era como se tivessem sugado todas minhas energias. Quinze dias depois, já fiz a segunda sessão. E, em curtos intervalos, me submeti a seis delas antes de entrar para a cirurgia que retirou 100% do meu estômago. No total foram sete meses em tratamento, do diagnóstico até receber alta. Depois da operação, eu deveria ter encarado mais seis sessões de quimioterapia para garantir que não restasse nenhum resquício do câncer em mim. Mas a cada nova fase do tratamento eu perdia 3 kg! Descobri a doença pesando 80 kg e na décima sessão já estava com 58 kg. Preocupado, pedi para não fazer as duas últimas. Os médicos se reuniram para avaliar meu caso e me liberaram. Ufa! Ao contrário do que eu pensava, minhas restrições alimentares são pouquíssimas. Não uso manteiga ou margarina e só um pouquinho de óleo para preparar as comidas. Evito açúcares e gorduras porque me fazem mal, assim como refrigerantes, pois me dão mal-estar, náuseas, febre interna e suor frio. Se não mastigo bem os alimentos me sinto entalado, como se estivesse absurdamente cheio, estufado. Parece que estou engasgado. Quando isso acontece preciso me retirar da mesa e vomitar a comida no banheiro. Depois me limpo e volto a comer normalmente, mastigando com calma.

Se mastigar bem, posso comer quase tudo

     Hoje levo uma vida tranquila e saudável, caminho quatro vezes por semana e me alimento a cada duas horas, para ganhar peso. Aprendi a conviver com meu novo corpo e recuperei alguns quilos perdidos. Já estou com 64,5 kg e me sinto bem fisicamente. Ainda quero chegar aos 70 kg para ser um cinquentão campeão brasileiro de vôlei de praia!

Me alimento de livros, sonhos e fé

     Ler e escrever fazem parte de quem eu sou. Sempre tive o hábito de fazer ambos diariamente. Assim que descobri o câncer, passei a desabafar meus medos, desejos e reflexões num diário. Transformei minhas anotações em um romance chamado Folhas que Caem Vidas que Seguem (Editora Épica, R$ 35), onde sou protagonista da história com minha esposa e fiel companheira, a Fernandinha. Por estar de licença-saúde até 2016, passo a maior parte do dia em casa, lendo e escrevendo. Vou a livrarias, faço palestras motivacionais para pessoas de todas as idades e às vezes dou meu testemunho em igrejas. Minha fé só fez aumentar depois do câncer. Hoje sinto que precisava passar por isso. As pessoas esperam um momento de ruptura para buscar proximidade com Deus, independentemente da religião, mas essa busca tem que ser diária e honesta. E é isso que eu defendo quando palestro: nem um câncer é capaz de impedir a caminhada de quem tem fé. Durante os meses de tratamento li mais de 30 livros, principalmente romances históricos. Não fosse o conhecimento que a leitura me trouxe, somado à minha fé, talvez eu não estivesse aqui para contar minha história.

PRÊTENCI VELOSO JUNIOR, 45 anos, escritor e palestrante, São Luís, MA

 

Acredite se quiser: estômago é um órgão dispensável

     É completamente natural sobreviver sem estômago. A afirmação é de Bruno Zilberstein, professor de cirurgia da faculdade de medicina da USP. “Ele é um órgão de trituração, mas o intestino fino (conhecido como delgado), embora não faça essa função, se adapta para receber os alimentos. Aí, as enzimas digestivas fazem o resto do processo da digestão”, explica. Segundo o especialista, “de seis a oito meses após a retirada do órgão, o organismo se adapta sozinho e a pessoa segue uma vida normal. É como a cirurgia feita contra  a obesidade, que costuma retirar 95% do estômago”. A única adaptação necessária é uma complementação vitamínica de B12 e ferro, “pois o intestino não as absorve”. Fora isso, alguns pacientes podem desenvolver uma certa intolerância a leites e derivados, mas de maneira leve, conclui Zilberstein.

Fonte: Sou mais Eu UOL

Mais Notícias

Voltar

Newsletter

Assine para receber informações e mais notícias.